Sete novos pecados mortais na área da Justiça

  • Ignorância 
  • Superficialidade 
  • Subjectividade 
  • Venalidade 
  • Parcialidade 
  • Vaidade 
  • Arbitrariedade

No mundo actual, fala-se. Fala-se de tudo. Fala-se muito. Fala-se demais. Fala-se sem saber. E fala-se sem conhecer. Fala-se sem que se percebam as causas. E sem que, do que se diz, se ponderem as consequências. Mesmo os mais responsáveis, quantas vezes, falam, falam, “atiram pedras”, “chafurdam o charco” e “lançam lama”. Não enxergam, negam ou minimizam, as culpas próprias e só apontam, ficcionam ou aumentam, as de terceiros. Todos, e todos sem excepção, temos responsabilidade no que alguns já chamaram de estado permanente de “palrança”. Uns por acção. Outros por omissão. Tanto o permitem o atrevimento dos ignorantes como a inércia dos poderes.

Porque se fala tanto e tantas vezes demais? Talvez porque hoje tenhamos sete novos pecados mortais na área da justiça: a ignorância, a superficialidade, a subjectividade, a venalidade, a parcialidade, a vaidade e a arbitrariedade. Gesticula-se, grita-se, berra-se, acusa-se, mas não se apresentam soluções racionais e pragmáticas, não se procura o consenso, nem se apontam caminhos de cooperação. Fala-se muito.

Trabalha-se pouco. Fala-se demais. E fala-se mal. Mal porque com erros. E mal porque sempre com maledicência. Dizem-se asneiras. Desprestigia-se a justiça. Potencia-se a crise. Cavalga-se a conflitualidade. Falta sentido do Justo e de Estado; falta seriedade, decência, urbanidade e contenção.

Pede-se reserva, pois. O que não quer dizer inércia, silêncio ou demissão. Muito menos rolha, mordaça ou submissão. Reserva significa falar e escrever livremente, no foro próprio. A reserva não implica menor liberdade de expressão. Implica, sim, dignidade na expressão. Independência e elevação na actuação. Rigor e exigência na acção. A reserva não implica sequer impossibilidade de crítica. Exige, sim, uma crítica séria e fundada, no momento devido e no local apropriado. Mas crítica não chega. É necessária a construção.
Mas é mais fácil dizer qualquer disparate do que fazer algo de útil.

Não admira, pois, que até na lei se invertam ou subvertam as “prioridades na área da justiça”. Por exemplo, quer-se apenas a “promoção da celeridade e eficácia” da investigação criminal. Já não se pede, sequer, no que toca à investigação criminal, a sua qualidade, profundidade e fidedignidade. Quer-se acabar estatisticamente com as execuções pendentes. Mas não resolvê-las. Sinal dos tempos! Tempo em que há cada vez mais “agitadores eficazes” e cada vez menos “liderança fiável”. Tempo em que o que parece se sobrepõe ao que é e ao que deve ser.

A demagogia grassa. A justiça não passa. E a lei definha. A lei justa é, ou devia ser, o único instrumento de poder e a única voz de comando, ao menos para juízes, magistrados, advogados e polícias. Mais do que a capacidade de obrigar da norma, o uso do comando legal é, ou devia ser, a arte de influenciar comportamentos e de dirigir os cidadãos. Com inteligência. Com argumentos. Com exemplo. E não com falácias e a força da destruição.

No Direito mais do que se ser obedecido procura-se, ou deve procurar-se, a especial capacidade de se ser seguido, de se ser aceite e de se convencer. Isso só se obtém pela conduta exemplar e pelo exercício sereno e sóbrio do dever. Sem falar demais. Sem fala baratos. Mas também sem calar as injustiças. Sem invertebrados.

Carlos Pinto de Abreu

Sem comentários: